sexta-feira, 14 de maio de 2010

Asteróides: uma Odisseia actual


Antes de falar dos Asteróides, que são um dos constituintes do Sistema Solar apesar de serem “corpos menores”, gostaria de relatar uma das mais extraordinárias aventuras espaciais humanas.

Os conhecimentos sobre os Asteróides dependiam grandemente dos dados fornecidos pelos meteoritos. Mas havia sempre a questão, nada fácil, de saber exactamente a que asteróide pertencia determinado meteorito. Por isso, o melhor era aterrar uma sonda espacial num asteróide, tirar fotografias, utilizar os mais variados instrumentos fotográficos e espectroscópicos, recolher amostras e regressar com elas.
É neste contexto que ISAS (Instituto do Espaço e Ciência Astronáutica) da JAXA (Agência de Exploração Aeroespacial do Japão) projectaram a missão Muses-C, mais tarde chamada Hayabusa, cujos objectivos eram:
- recolher material do asteróide e trazê-lo de volta;
- fazer uma análise exaustiva do asteróide: forma, rotação, topografia, cor, composição, densidade, propriedades fotométricas e polarimétricas, estrutura interior e história;
- testar novas tecnologias, nomeadamente os motores iónicos.
A missão seria realizada pela sonda Hayabusa.



A sonda Hayabusa, "falcão" em japonês, é uma “caixa” com 1,5 m de lado e 1,05 m de altura, que pesa 530 kg, incluindo 50 kg de combustível químico e 65 kg de gás Xénon.

Está equipada com câmaras para fotografias, com uma resolução de 30 m na fase de mapeamento e de 1 a 2 cm quando estiver “aterrada", para estudos de polarimetria no Visível e para navegação óptica próxima do asteróide e com um instrumento de alinhamento e cálculo de distância por laser (LIDAR) e espectrómetros nas bandas do Infra-Vermelho próximo e do RX.
Tem dois painéis solares, um de cada lado, com 12m2 e uma antena parabólica de “alto ganho” com 1,5 m de diâmetro montada na parte superior de uma espécie de giroscópio (gimbal) de dois eixos.
As comunicações são asseguradas por antenas de "baixo ganho", nas bandas X e S, e uma antena parabólica de "alto ganho", na banda X.
Como a comunicação da Terra com o asteróide demora cerca de 17 minutos e vice-versa, dispunha ainda de um sofisticado sistema de navegação autónomo capaz de fazê-la aproximar-se e afastar-se da superfície do asteróide e de "decidir" o que fazer conforme as circunstâncias, sem a intervenção humana. Trata-se, portanto, de um diálogo em que os intervenientes demoram 34 minutos a receber a resposta a uma pergunta. Não se esqueça este pormaior para perceber a grande façanha que foi esta odisseia.
É alimentado por células solares de Arseneto de Gálio (GaAs)  e pilhas de Hidreto de Níquel metálico (Ni-MH) recarregáveis com um tempo de vida de 15 h.
Um “funil”, coluna cilíndrica, estender-se-á da parte inferior depois do lançamento e serve para aspirar a poeira e pequenos fragmentos de rochas do asteróide.
Levava quatro motores iónicos de Xénon destinados a serem utilizados, especialmente, na viagem de regresso.
Um motor iónico (ion thruster) ioniza (transforma átomos em iões e electrões) o gás Xénon. Este plasma ionizado é depois acelerado por campos eléctricos de alta voltagem, originando um contínuo, embora fraco, impulso. O seu modo de impulsão é semelhante ao funcionamento de um  motor de reacção dos aviões a jacto.


Para as operações de maneuvering (qualquer movimento planeado na trajectória da sonda), conta com um sistema de propulsão de Tetróxido de Azoto (N2O4) e Hidrazina (N2H4). Durante as “fases de cruzeiro” é propulsionada por dois motores iónicos.

Leva uma cápsula de reentrada, separada e almofadada, com 45 cm de diâmetro e 25 de altura pesando 20 kg, junto ao “funil” de recolha das amostras. A cápsula tem um “nariz” convexo coberto com 3 cm de um camada protectora do calor para proteger as amostras do enorme calor produzido pela enorme velocidade de reentrada, cerca de 13 km/s.
Transporta ainda um robô, o Minerva, que será colocado na superfície do asteróide para recolher o máximo de dados.
O Robô MINERVA, acrónimo de Micro/Nano Experimental Robot Vehicle for Asteroid, pesa 591 g e tem apenas 10 cm de altura. Leva vários instrumentos de análise e dispõe de três câmaras a cores.


As duas inferiores permitem construir uma imagem estéreo da superfície, com capacidade para registar os objectos situados entre 10 a 50 cm do ponto de pouso, com uma resolução até 1 mm. A terceira, mais acima, servia para fotografar as zonas mais distantes; esta câmara continuaria a operar mesmo quando o robô andasse a saltitar pela superfície do asteróide.
Dispunha ainda seis sensores para medir a temperatura da superfície, o que permitiria saber se esta era formada de poeiras ou de rochas.

DIÁRIO DE BORDO

O perfil da missão teve de sofrer muitas alterações antes e depois do lançamento.

A equipa escolheu o asteróide Nereus porque, apesar da sua pequena dimensão (300 m), era o mais acessível a partir da Terra. O lançamento seria em Julho de 2002.

Em Julho.2000, houve problemas com o foguetão japonês M-5, que devia lançar a sonda, obrigando a um adiamento. Nesse tempo, Nereus afastou-se impedindo a sua utilização como alvo; o mesmo sucedeu com a segunda alternativa, o asteróide 1989ML. Foi então que a escolha recaiu sobre o Itokawa.

O asteróide Itokawa tem as segintes características:
Dimensões: 535 m x 294 m x 209 m;
Período de translação: 1,5 anos;
Período de revolução: 12  h;
Temperatura: -67 ºC;
Distância média ao Sol: 200 milhões de km (1,3 UA), variando entre 0,95 (periélio) e 1,7 UA (afélio).

Foi recentemente observado por IRC (Câmara de Infravermelho) do AKARI, o primeiro satélite japonês dedicado à Astronomia no Infravermelho. A imagem seguinte é uma sobreposição de três, tiradas entre as 11:23 e as 11:35 (UT) de 26.Julho.2007.


Trata-se de um asteróide muito pequeno em forma de batata:


Gráficos feitos a partir de observações de radar do Goldstone e do Arecibo.

Tem uma órbita bastante excêntrica.


Na nuvem dos asteróides, destaca-se a órbita de Itokawa sobre as órbitas dos planetas telúricos.
Estas posições correspondem a 1.Set.2005.

Em Novembro.2000, houve mais um percalço: a  NASA, por razões financeiras, desistiu do veículo todo-o-terreno MUSES-CN que se tinha comprometido construir para ser levado na sonda Hayabusa. Deveria medir a textura, composição e morfologia do solo com uma precisão inferior a 1 cm, por meio de uma câmara multi-espectral, no Infravermelho próximo e no RX e de um espectrómetro de partículas alfa. Pesaria cerca de 1 kg e deveria ser capaz de rolar, subir e saltar sobre a superfície utilizando a energia solar.
Foi mais um conributo para o atraso, pois obrigou os japoneses a construirem o Minerva.

Em Dezembro.2002, a partida da sonda Itokawa teve de ser adiada para Maio.2003, porque, ao fazer-se o último "check-out", se verificou que uma peça do sistema de controlo não tinha a qualidade exigida.

A 9.Maio.2003, procedeu-se ao lançamento da sonda Hayabusa pelo foguetão M-5, às 04:29:25 UT (13:29 locais), no centro de lançamentos Kagoshima. Depois de lançada, aproveitou o impulso gravitacional da Terra, um método análogo ao milenar “efeito de funda”: a sonda orbita em volta da Terra para acelerar e partir para longes terras.

Alguns meses depois, uma forte tempestade solar danificou os painéis solares da sonda, reduzindo a eficiência eléctrica dos motores iónicos, o que adiou a data de chegada ao asteróide de Junho para Setembro de 2005. Como a sonda deveria partir do asteróide até Novembro desse ano, este acidente encurtou o tempo de estadia no asteróide, nomeadamente reduzindo de três para duas as aterragens que a sonda aí devia executar.

O quadro seguinte ilustra as principais operações, e respectivos tempos, ocorridas durante a viagem de ida.

A 31.Março.2004, os motores íónicos (ion thruster) foram parados para utilizar o "balanço" (swing-by) da Terra que colocaria a sonda a caminho do asteróide. Recorde-se o "efeito de funda" que referi atrás.

A 12.Maio.2004, foi feita a última manobra antes do swing-by.

A 19.Maio.2004, aconteceu o swing-by, a uma altitude de 3 725 km, às 6:23 UT.
A 27.Maio.2004, os motores iónicos foram ligados novamente.

A 18.Fev.2005, sonda está a 1,7 UA da Terra, o ponto da órbita do asteróide mais afastado do Sol (afélio).

A 31.Julho.2005, falhou o pequeno motor de orientação do eixo do X.
A sonda, como todas as cápsulas espaciais, dispõe de três pequenos motores de orientação segundo os três eixos, X, Y e Z, para, por meio de pequenos impulsos, rectificar qualquer desvio.

A 14.Agosto.2005, a sonda enviou a primeira fotografia do Itokawa, apenas ainda como um ponto brilhante, que vai crescendo conforme se aproxima.

A 28.Agosto.2005, a impulsão foi mudada dos motores iónicos para os motores de combustão "normal" (bi-propulsor), para fazer a entrada na órbita em torno do asteróide.
A 4.Setembro.2005, as fotografias confirmam a forma alongada do asteróide.

A 11.Setembro.2005, já se distinguem pequenas elevações.  

À esquerda o "monte" mais elevado (50 m);
à direita uma rocha fragmentada.

A 12.Setembro.2005, a sonda chega a 20 km do asteróide, à 1:17 UT, e os cientistas anunciaram que ela tinha "chegado". Foi esta, portanto, a data oficial da chegada ao Itokawa, depois de ter percorrido 2 mil milhões de km.
A sonda não ficou a orbitar em torno do asteróide, mas permaneceu numa órbita heliocêntrica.

A 4.Outubro.2005, a sonda foi deslocada, com sucesso, para o seu "acampamento de base", a 7 km da superfície. Foram tiradas muitas fotografias.
Entretanto, foi anunciado que, na véspera, o motor de orientação do eixo do Y deixara de funcionar, restando apenas o do eixo do Z. O controlo do posicionamento far-se-á com este motor do eixo do Z e com dois motores químicos.
A sua primeira tarefa foi fotografar e analisar o asteróide – morfologia, rotação, topografia, cor, composição e densidade – e procurar um local apropriado para “aterrar”.

A 3.Novembro.2005, a sonda estacionou a 3 km e iniciou uma aterragem de ensaio, para proceder ao lançamento do robô Minerva e de um “marcador de alvo”, uma pequena esfera metálica que servia para identificar o local onde a sonda devia “aterrar”. Este marcador contém 880 000 assinaturas que foram recolhidas pela Sociedade Planetária do Japão e ficarão para sempre no asteróide.
A 4.Novembro.2005, à 1:50 UT, a descida teve de ser cancelada, aos 700 m, devido à detecção de um “sinal anómalo” relativo ao sistema GO/NOGO, um sistema que permite decidir se o processo deve prosseguir (go) ou não (no go). Este sinal pode estar relacionado com a dificuldade do sistema de navegação óptico conseguir focalizar bem o asteróide, talvez por causa da sua forma complexa e diminuta.

A 7.Novembro.2005, subiu de novo para o "acampamento base", a 7 km.

9.Novembro.2005, fez uma nova descida até aos 70 m para testar o sistema de navegação e o altímetro a laser. Voltou a subir para a posição "de base", descendo, depois, para os 500 m para libertar um dos "marcadores". 


A análise das fotografias revelou que o ponto B (Deserto Woomera) era demasiado rochoso para fazer a aterragem, pelo que foi seleccionado o ponto A (Muses Sea).


A 12.Novembro.2005, foi tentada uma nova aproximação, descendo, à velocidade de 3 cm/s, de 1,4 km de altitude para os 55 m.. O robô Minerva foi libertado, às 6:34 UT (15:34h do Japão), quando as comunicações caíram.
Ao serem retomadas, verificou-se que, àquela hora, a sonda não estava na altitude prevista para o lançamento do Minerva (55 m), pelo que esta se perdeu no espaço. A sonda terá atingindo os 55 m cedo demais e iniciara uma subida automática (recorde-se que devido ao facto de as comunicações demorarem 17 minutos para cada lado, a sonda dispunha de um sistema autónomo para subir e descer conforme as circunstâncias), de tal modo que o Minerva foi lançado de uma altura de cerca de 200 m, adquirindo uma velocidade maior do que a prevista. Isso não seria problema se a gravidade do Itokawa não fosse apenas um centésimo milésimo da Terra; mas, sendo tão débil, não teve "força" suficiente para puxar o robô para a sua superfície e este acabou por se perder no espaço.

A 19.Novembro.2005, às 12:00 UT, a sonda iniciou nova descida, partindo da altitude de 1 km. Às 19:33, a aproximação final passou a ser comandada da Terra, descendo de 450 m, a 12 cm/s. Às 20:30, foi lançado o "marcador", 40 m acima do asteróide, e a sonda passou a descer a 3 cm/s. Depois, aos 17 m, reduziu a velocidade para zero e entrou em queda livre, momento em que se perderam as comunicações.
Quando estas foram restabelecidas, a sonda estava a 100 km do asteróide. Então foi posta em “modo de segurança” (safe mode: situação em que só ficam ligados os sistemas mínimos) para decidir o que fazer. Uma possível explicação é que os sensores da sonda detectaram um aquecimento na sua estrutura e por isso o seu sistema automático de navegação atirou-a para longe do asteróide. Contudo, segundo as informações de telemetria, obtidas depois de restabelecido o contacto, a sonda tocou a superfície, no Muses Sea, às 20:40, a uma velocidade de 10cm/s, que a fez saltitar, tornando a tocar o solo às 21:10 e acabando, finalmente, por aterrar às 21:30, a 30 m do "marcador". Às 21:50, foi comandada para fazer uma subida de emergência.
Assim, a sonda permaneceu na superfície meia hora mas não recolheu qualquer amostra. Pela primeira vez, uma sonda aterrou e pela primeira vez uma sonda descolou, sob controlo humano, de um corpo do Sistema Solar, exceptuando a Lua.

Tentativa de Aterragem (Crédito: ISAS/JAXA)
O ponto branco, junto da sombra da sonda, é o marcador.

No dia 24.Novembro.2005, às 10 h da noite no Japão, a sonda, situada a 1 km, iniciou a sua lenta descida em direcção ao asteróide. Às 6:52, do dia seguinte, a sonda reconheceu o marcador anteriormente lançado. Um minuto depois, estava a 35 m e descia a uma velocidade de 4,5 cm/s. Às 7:07, foram disparadas as duas bolas de chumbo para levantar a poeira, com um intervalo de 0,2 s. Às 7:35 aterrou segunda vez no asteróide.


As amostras, se foram recolhidas, terão uma massa da ordem de 1 g. Espera-se que, mesmo que as esferas não tenham sido disparadas, um pequeno número de partículas possa ter sido recolhida durante a aterragem dada a gravidade extremamente baixa do asteróide.

A 27.Novembro.2005, a sonda sofreu uma interrupção no fornecimento de energia quando tentava uma correcção de posicionamento, provavelmente devido à perda de combustível.

A 30.Novembro.2005, as comunicações foram de novo restabelecidas, mas mantinha-se o problema com o sistema de controlo. Os controladores tentavam a todo o custo uma solução que permitisse aproveitar a "janela" de tempo que estava a fechar-se para poder fazer regressar a sonda. Se a sonda não partisse do asteróide até meados de Dezembro, só poderia fazê-lo em 2007, quando surgisse uma nova “janela”, o momento em que a distância entre a Terra e o asteróide é a ideal para a viagem de regresso.

A 2.Dezembro.2005, foi tentada uma nova correcção de posicionamento mas o motor não forneceu energia suficiente.

 A 3.Dezembro.2005, o motor de reacção do eixo do Z estava desalinhado 20 a 30º da direcção do Sol e com tendência para aumentar.

A 4.Dezembro.2005, como medida de emergência, foi injectado mais Xénon para os motores iónicos corrigirem a rotação (spin), operação que correu com sucesso. Agora o controle do posicionamento passou a ser comandado, usando o Xénon.

A 5.Dezembro.2005, o posicionamento estava suficientemente controlado para retomar as comunicações através da antena de ganho médio. Os dados agora recolhidos não clarificam se as esferas de chumbo atingiram a superfície.

A 6.Dezembro.2005, a sonda está já a 550 km do asteróide.

A 8.Dezembro.2005, observou-se uma repentina mudança de altitude, possivelmente devido a uma fuga de 6 a 10 cc de combustível: mais uma perda! E também deixou de haver contacto, porque o "binário" (torques) causado pela falha do motor alterou a orientação da antena.  Agora tornava-se necessário estabilizar a sonda, passando de um movimento de precessão para um de rotação, e alinhá-la com o Sol e a Terra segundo o ângulo específico adequado. Mas não havia contacto para poder realizar tais operações.

A 12.Dezembro.2005, devido à grande degradação dos vários sistemas, à dificuldades de manter contacto e de pôr em funcionamento adequado o motor iónico da sonda, a “janela” de partida fechou-se e a sua partida ficou impossibilitada. Assim, a sua chegada à Terra, prevista para 2007, só acontecerá em Junho de 2010.

A partir de 23.Janeiro.2006, foram restabelecidas gradualmente as comunicações com os vários sistemas.
 
A 6.Março.2006, as comunicações ficaram totalmente restabelecidas e verificou-se que a sonda estava na órbita do Itokawa, 13 000 km à sua frente, com uma velocidade relativa de 3 m/s.
 
Dos finais de Abril a meados de Maio de 2006, foram verificados os motores iónicos: B e D mantinham o rendimento normal; o teste do C foi adiado para Janeiro seguinte quando estivesse mais próxima do Sol, dado que a fonte de alta voltagem era muito sensível; mas a equipa pensava que estaria funcional; o A ficou de reserva. Também havia Xénon suficiente para a viagem.
Contudo, era iminente o perigo de alguns motores falharem, pelo menos um deles, que já trabalhara mais de 13 500 horas, sendo o limite previsível as 14 000 horas.

A 30.Janeiro.2007, a equipa informou que 7 das 11 baterias de Lítio estavam a trabalhar.
Passarão a ser utilizadas baterias solares para ligar os motores iónicos, que substituirão os motores químicos, e para manter o controlo do posicionamento. Os motores iónicos funcionarão até Novembro.2007, quando serão desligados e a sonda entrará em "modo de hibernação", continuando numa trajectória balística. A quantidade de Xénon é ainda suficente para tudo isso. 

25.Abril.2007, a Hayabusa começou a sua viagem de regresso.


A 28.Julho.2007, foi ligado também o terceiro motor iónico, o C. Como este só tinha funcionado 7 000 horas, o seu tempo de vida era muito superior ao dos outros dois, B e D.

A 29.Out.2007, foi dada por terminada a primeira fase da operação de controlo da trajectória e a sonda ficou com a rotação estabilizada.

A 16.Abril.2008, deixou de funcionar o motor de reacção do eixo do Z, o último dos três iniciais necessários para apontar a sonda. Esta "falha catastrófica" pode impedir a sonda de alcançar o nosso planeta e de libertar a cápsula para a atmosfera. Os cientistas estão agora a apontar os jactos iónicos de Xénon. Estes jactos foram originalmente desenhados para apenas mover a nave para a frente durante a  viagem.
Mais tarde, o motor C foi desactivado devido a problemas de alta tensão.

A 4.Fev.2009, foram ligados com sucesso os motores iónicos e iniciada a segunda fase de rectificação da trajectória para o seu regresso à Terra.

A 4.Nov.2009, o último motor iónico, o D, deixou de funcionar devido a um pico de tensão, deixando a sonda sem meios de propulsão. Perante esta situação, os engenheiros japoneses inventaram um plano para para poderem retomar a viagem, combinando partes dos dois motores parcialmente avariados: utilizaram o neutralizador do motor A e a fonte de iões do motor B para fornecer a energia suficiente (chamada delta-v, literalmente "mudança de velocidade") para a garantir a velocidade de 200 m/s indespensável para poder chegar à Terra.

A 5.Março.2010, a sonda está numa trajectória que passa pelo interior da órbita lunar. Os motores iónicos são suspensos para calcular a trajectória exacta, ou melhor, a adequada mudança de órbita (Trajectory Correction Maneuver 1: TCM-1) para uma correcta aproximação à superfície da Terra.
Para explicitar graficamente o que é isso do TCM (Trajectory Correction Maneuver) vou servir-me do lançamento de um objecto para Marte que precisa de quatro mudanças de órbita: TM-1, TCM-2, TCM-3 e TCM-4. 


A 27.Março.2010, foi desligado o último motor, após ter acelerado a sonda até 400 m/s no último ano: a Hayabusa está numa trajectória que passará a 20 000 km do centro da Terra, completando a operação de transferência da órbita do Itokawa para a Terra.

A 6.Abril.2010, completou-se a primeira etapa da mudança de órbita (TCM-0), que controla grosseiramente a trajectória de aproximação à superfície da Terra. Está planeada para acontecer 60 dias antes da reentrada na atmosfera.

A 4.Maio.2010, às 11:57 locais foi completada a TCM-1
As restantes irão acontecer: a 29.Maio, a TCM-2; a 6.Junho,a TCM-3 para mudar a trajectória da Terra para o local de aterragem, Woomera, na Austrália do Sul; TCM-4, a última manobra de precisão para a aterragem, a 10.Junho.

A 13.Junho.2010, a cápsula, onde vem o contentor com (esperamos!) as amostras recolhidas, separar-se-á da sonda, entre os 400 e os 300 mil km da Terra, às 11:00 UT e fará a sua reentrada na atmosfera, às 13:00 UT, numa trajectória balística. Enquanto a sonda se desintegrará na atmosfera, a cápsula, viajando a 12,2 km/s,  abrirá o seu pára-quedas e aterrará na zona de Woomera, no Sul da Austrália.


Mas ainda é preciso superar uma última dificuldade complicada. As cápsulas raramente entram na atmosfera com esta velocidade (geralmente caem três vezes mais devagar), sofrendo uma desaceleração de 25 G. Portanto, a cápsula deverá, antes de abrir o seu pára-quedas, originar uma bola de fogo quando atingir os 200 km de altitude, com um brilho várias vezes superior ao de Vénus.


Depois deste esforço todo, esperamos que ela não se desintegre com o calor, que os pára-quedas abram a tempo e … que dentro dos seu contentor venha alguma poeira e pedaços de rocha do Itokawa!!!


BALANÇO

Independentemente de trazer ou não as primeiras amostras extraterrestres, para lá das lunares, a sonda forneceu muitos elementos preciosos: 1 600 imagens, 120.000 dados espectrais no infravermelho, e 15.000 dados com o seu espectrómetro de RX, num total de 15 G de informações.

Volto a recordar as inúmeras dificuldades: o tamanho do Itokawa (530m x 270m x 210m), o seu movimento de rotação e a sua gravidade muito fraca; a sua órbita que passa a uma distância mínima da Terra de 290 milhões de km; os dois mil milhões de km que a sonda teve de percorrer.

PARABÉNS a tantos cientistas e técnicos que participaram nesta odisseia e também à sonda Hayabusa.


Falta acrescentar à festa o foguetão M-5, que começou a odisseia, e a sua família.



Esatamos perante uma maravilha, uma maravilha, uma maravilha da inteligência humana. Mas isto é "só" a maravilha da técnica e da ciência, ainda não é a do coração. Até porque, o caminho para a Lua é mais curto do que para o coração, dizia de Gaulle.
Portanto não basta termos o saber da técnica e da ciência; não bastam os cientistas sábios. Precisamos de pensadores, de quem se interrogue não só sobre os comos mas principalmente sobre os porquês. Precisamos de profetas, de utópicos, de filósofos, de sonhadores de futuros que apontem rumos éticos e ajudem a balizar, sem cortar a criatividade, os caminhos da ciência e da História.
Se assim não for, o Homem Novo fará "exactamente como faria o Homem Velho":

POEMA DO HOMEM NOVO
António Gedeão in Novos Poemas Póstumos

Niels Armstrong pôs os pés na Lua
e a Humanidade saudou nele
o Homem Novo.
No calendário da História sublinhou-se
com espesso traço o memorável feito.

Tudo nele era novo.
Vestia quinze fatos sobrepostos.
Primeiro, sobre a pele, cobrindo-o de alto a baixo,
um colante poroso de rede tricotada
para ventilação e temperatura próprias.
Logo após, outros fatos, e outros e mais outros,
catorze, no total,
de película de nylon
e borracha sintética.
Envolvendo o conjunto, do tronco até aos pés,
na cabeça e nos braços,
confusíssima trama de canais
para circulação dos fluidos necessários,
da água e do oxigénio.

A cobrir tudo, enfim, como um balão ao vento,
um envólucro soprado de tela de alumínio.
Capacete de rosca, de especial fibra de vidro,
auscultadores e microfones,
e, nas mãos penduradas, tentáculos programados,
luvas com luz nos dedos.

Numa cama de rede, pendurada
da parede do módulo,
na majestade augusta do silêncio,
dormia o Homem Novo a caminho da Lua.
Cá de longe, na Terra, num borborinho ansioso,
bocas de espanto e olhos de humidade,
todos se interpelavam e falavam,
do Homem Novo,
do Homem Novo,
do Homem Novo.

Sobre a Lua, Armstrong pôs finalmente os pés.
Caminhava hesitante e cauteloso,
pé aqui,
pé ali,
as pernas afastadas,
os braços insuflados como balões pneumáticos,
o tronco debruçado sobre o solo.

Lá vai ele.
Lá vai o Homem Novo
medindo e calculando cada passo,
puxando pelo corpo como bloco emperrado.

Mais um passo.
Mais outro.
Num sobre-humano esforço
levanta a mão sapuda e qualquer coisa nela.
Com redobrado alento avança mais um passo,
e a Humanidade inteira,
com o coração pequeno e ressequido,
viu, com os olhos que a terra há-de comer,
o Homem Novo espetar, no chão poeirento da Lua, a bandeira da sua Pátria,
exactamente como faria o Homem Velho.

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