terça-feira, 14 de maio de 2013

Uma cronologia do Universo

Para melhor compreender a história do Universo convém ter presente as observações que se seguem.

1) Expansão igual a arrefecimento
O universo, como qualquer corpo, ao expandir-se, vai arrefecendo, ou seja, vai diminuindo a temperatura. Energia e temperatura resultam dos choques entre os átomos. Sendo constante a energia total do Universo, um aumento de volume implica uma diminuição  dos choques e, consequentemente um abaixamento da energia por unidade de volume.
Portanto, o que é conveniente reter é que, como o Universo está em expansão, está também a arrefecer.

2) Matéria e Antimatéria
Sabe-se que há uma relação íntima entre energia e massa traduzida pela célebre equação de Einstein, E = mc2, uma equação que significa, entre outras coisas, que a energia e a massa se podem converter uma na outra. Desde que haja energia suficiente, ela pode “materializar-se” em partículas, sempre aos pares: uma partícula e uma antipartícula. Por exemplo, se for de 2 GeV (o eV é uma unidade de medida da energia), ela pode criar um protão e a sua antipartícula, o antiprotão, porque cada um deles equivale à energia de 1 GeV. Mas se a energia, melhor, se a densidade média de energia for 1 MeV, já não é possível “materializar” 1 protão e 1 antiprotão, mas “apenas” 1 electrão (0,5 MeV) e a sua antipartícula, o positrão (0,5 MeV). Portanto, quanto maior for a energia disponível, mais pesadas são as partículas formadas (ver esquema abaixo lado esquerdo). 
Por outro lado, quando se encontram, cada partícula e a respectiva antipartícula “aniquilam-se”, transformando-se em energia. No caso do electrão e do positrão, ao chocarem, aniquilam-se, “desaparecem", e em seu lugar fica disponível uma energia de 1 MeV, igual à soma das massas do electrão e do antielectrão. A energia libertada, neste caso, toma a forma de dois fotões de 0,5 MeV cada um (ver esquema abaixo lado direito).

Lado esquerdo: um fotão (1 MeV) pode materializar-se em duas partículas: o electrão e o anti-electrão (positrão).
Lado direito: um electrão e um positrão ao chocarem aniquilam-se, originando dois fotões em sentidos opostos.

É preciso compreender bem isto, porque estas reacções – materialização / aniquilação – estão a ocorrer constantemente no Universo até que deixe de haver energia suficiente para formar partículas. Quanto maior for a energia, maior é a massa das partículas que se podem materializar, algumas delas bem exóticas e que só devem ter existido no ambiente extremamente energético dos primeiros momentos do Universo. Quando a energia baixar de 1 MeV já não há mais materialização de partículas, embora as que existem sempre que se encontram com a sua antipartícula continuem a aniquilar-se até desaparecerem todas.
À medida que a expansão avança, a temperatura vai baixando e, portanto, a densidade de energia vai diminuindo, deixando de ser possível a materialização das partículas cuja massa corresponde a energias mais elevadas. E aqui coloca-se uma questão. Por que é que hoje quase não existe nenhuma antimatéria? Deve ter havido um mecanismo que permitiu o aparecimento de um pouco mais de matéria, pois, caso contrário, a matéria e a antimatéria ter-se-iam aniquilado totalmente. Não haveria nem matéria nem antimatéria e não estaríamos aqui.

3) Nomes estranhos
A história que se segue está repleta de partículas como nomes estranhos – hadrões, bariões, mesões, leptões, quarks – que são as diferentes partículas da matéria e também outros nomes – gluões, bosões, gravitões – que são partículas mediadoras das quatro forças fundamentais que governam as relações entre as partículas da matéria. Deixo aqui apenas a referência para que não se preocupem. Diria que todas estas partículas fazem parte coerente do chamado “Modelo Padrão” da matéria, que explica a existência da matéria e das forças que a governam. Não valerá a pena dizer muito mais. Quando um destes palavrões aparecer já sabem que se trata de partículas de matéria mais pesadas (quando a temperatura é mais elevada) ou mais leves (quando a temperatura é mais baixa) ou de partículas mediadoras das forças que ligam a matéria.
Na coluna da esquerda temos os quarks (u e d) e o electrão e o neutrino (leptões); estas quatro partículas da primeira coluna formam toda a matéria “normal” (as segunda e terceira colunas têm mais quatro quarks que são instáveis).
Na coluna da direita temos as “partículas” mediadoras das forças que ligam os constituintes da matéria: o fotão (γ), para a força electromagnética; o gluão, para a força forte e os bosões Z e W, para a força fraca; falta apenas o gravitão, para a força da gravidade.
Isolado do lado direito está o famoso bosão de Higgs, suporte de todo o Modelo.

Feitas estas recomendações, vamos a ver se a história do Universo que se segue fica compreensível. Espero que as notas não tenham baralhado muito, especialmente a nota 3). Mas se baralharam é simples: ignore-a e procure acompanhar a história.

É altura de contar a história do Universo tal como hoje se supõe ter acontecido, a partir do Big Bang. Há várias histórias conforme se toma como grelha de leitura as partículas dominantes ou as forças de interacção. Na imagem abaixo está uma dessas propostas.

Contudo eu irei apresentar outra ligeiramente diferente. A vantagem é perceber que por uma ou outra forma são sempre os mesmos acontecimentos que são referidos. Portanto, segue-se um relato que pretende ser cientificamente correcto. Mais tarde, num próximo post, farei uma narração mais antropomórfica, mas talvez mais inteligível. Pelo menos, assim espero!
  
ANTES DO BIG BANG
Gamow acusa S.to Agostinho de ter dito que “nesse tempo” Deus criava o inferno para para lá mandar os que se ocupavam destes problemas.

À entrada do quinto círculo do Inferno acumulam-se, no rio Estige, os condenados pelo pecado da ira
                
O tom irónico diz bem com Gamow. Só com um pequeno pormenor: não é verdade. O que realmente diz S.to Agostinho é: “Eis a minha resposta àquele que pergunta: «Que fazia Deus antes de criar o céu e a terra?» Não lhe responderei nos mesmos termos com que alguém, segundo se narra, respondeu, iludindo com graça, a dificuldade do problema: «Preparava – disse – a geena (o inferno) para aqueles que perscrutam estes profundos mistérios!» Uma coisa é ver a solução do problema e outra é rir-se dela. Não darei essa resposta. Gosto mais de responder: não sei – quando de facto não sei – do que apresentar essa solução, dando motivo a que se escarneça do que propôs a dificuldade e se louve aquele que respondeu sofisticamente” (Confissões, livro XI, 12).
Nada se sabe, como é natural, sobre um tempo tão fora das actuais teorias físicas.

Era de Planck: t < 10-43 s depois do Big Bang
Não sabemos nada do que aconteceu nesta era. Diz-se que tudo eram flutuações e convulsões quânticas, mas não se sabe. As flutuações aleatórias de energia são tão grandes que não podem ser explicadas. Como a energia e a massa são equivalentes (da Teoria da Relatividade: E = mc2), as flutuações enormes de energia causam mudanças aleatórias no espaço-tempo. Mas talvez nem sequer faça sentido falar de qualquer coisa, nem em intervalos menores de tempo, pois não há instrumentos matemáticos para fundamentar um modelo ou uma teoria. A actual física não é aplicável e torna-se necessária uma outra teoria que acasale a física quântica (que explica o infinitamente pequeno) com a teoria da relatividade (que se aplica o mundo macroscópico), o que não tem sido possível até agora.
Nesse sentido há várias teorias a incubar, ditas de gravitação quântica, tais como a teoria das cordas, que apresenta como partícula mais elementar não um ponto mas uma corda e trabalha em espaços com 10 ou mais coordenadas, ou a teoria quântica de laços, que tem como “partícula elementar” um laço do espaço-tempo.
As quatro forças ou interacções fundamentais estão todas unificadas numa só.

Tempo de Planck: t = 10-43 s
Este tempo foi determinado utilizando as três constantes: c (velocidade da luz), da Teoria da Relatividade; G (constante de gravitação universal), da Física Clássica e h (constante de Planck), da Mecânica Quântica. Jogando com as várias grandezas é possível obter este valor:

tPl = (Gh/c5)1/2

Para quem quiser ter o gozo de calcular o tempo de Planck, aqui deixo os valores das constantes:

G = 6,674 x 10-11 m3 kg-1 s-2
h = 6,626 x 10-34 m2 kg s-1
c = 3 x 108 m s-1

Eu fiz as contas e deu certo!!!
Ao juntar representantes das três teorias, este ponto marca o instante para trás do qual elas deixam de ter validade. Por isso nada se sabe do que se passa para trás do tempo de Planck.

Era da Grande Unificação (GUT): 10-43 s < t < 10-36 s
Esta era começa com a força da gravidade a separar-se das outras três que se mantêm unificadas, satisfazendo às teorias da grande unificação (GUT). Assim temos duas forças a controlar o Universo: a gravidade e a força das GUT.

Forças Fundamentais: Gravidade, Forte, Fraca e Electromagnética

Era Electrofraca: 10-36 < t < 10-12 s
Embora o nevoeiro conceptual comece a clarear, estamos num terreno bastante instável, a partir do qual se podem inferir algumas conjecturas. O universo estava muito quente (1032 K). O espaço estaria cheio de um gás efervescente de gravitões e de bosões  portadores da força GUT. Não deveria haver ainda uma distinção clara entre quarks e leptões, sendo provável que cada uma destas partículas fosse um híbrido das duas. 
Três acontecimentos são de destacar nesta era.

a) Separação da força forte
A era da GUT termina quando a energia ambiente é tal que a força forte se consegue desenvencilhar das outras que continuam associadas formando a chamada força electrofraca.


b) Inflação
Quando o Universo tinha 10-35 s (T = 1029 K) deve ter ocorrido a Inflação (10-35 a 10-32 s), momento em que o Universo sofreu um dramática expansão da ordem de muitas dezenas. As forças GUT destrançaram-se, dividiram-se em força forte e força electrofraca. Quando a força forte “congelou” (como os cristais de gelo na água) devido ao abaixamento da temperatura, houve a libertação da enorme quantidade de energia, que alimentou a inflação.

Inflação. Este fenómeno foi introduzido para resolver alguns problemas a que o Big Bang clássico não dava resposta.

Pouco depois da Inflação, o calor libertado produziu uma energia que permitiu o aparecimento de partículas e antipartículas. No final da era, houve um novo “congelamento”, uma nova mudança de fase que fez com que a força electrofraca se dividisse na força fraca e na electromagnética. As quatro forças estão finalmente autónomas. Com esta autonomização, os quarks e os leptões adquiriram a sua individualidade.

 c) Bariogénese
No final desta era há, sem se saber por que razão, ligeiramente mais protões do que antiprotões: 1 parte por 1 milhar de milhão (1/109). É deste excesso que resulta toda a matéria que forma o Universo. A palavra significa "génese de bariões", neste caso protões.


Era dos Quarks: 10-12 < t < 10-6 s
A partir de 10-10 s, a temperatura caiu o suficiente para que os quarks se associassem para formar hadrões (conjunto de três quarks) e mesões (conjunto quark-antiquark). Os fotões estão continuamente a criar pares de partículas-antipartículas, que ao encontrarem-se se aniquilam originando fotões de altas energias, os raios-gama. Os bariões instáveis acabam por decair nos dois bariões mais leves e estáveis, os nossos conhecidos protão e neutrão.
Por outro lado, a temperaturas do Universo atingiu valores que já não permitiam que os hadrões e anti-hadrões fossem materializados e depois aniquilados. Assim, esta fúria assassina e criativa continuou até o Universo arrefecer de modo a que os fotões já não têm energia suficiente para criar mais pares de partículas e antipartículas.
O universo apresentava-se então como um caldo muito quente conhecido por plasma quark-gluão, uma salada de quarks, leptões, fotões (partícula mediadora da força electromagnética), bosões W e Z (partículas mediadoras da força fraca) e os gluões (partículas mediadoras da força forte). Sabemos que existiram estas “espécies” pois os aceleradores de partículas recriaram já estas condições no laboratório, provando a ocorrência destes componentes.


Plasma Quark-gluão realizada no laboratório
Fonte: Les Dossiers de la Recherche 23, p. 32-33
1 – Dois núcleos de Ouro foram atirados a elevadas velocidades um contra o outro. Parecem achatados por causa dos efeitos relativísticos decorrentes das velocidades elevadas.
2 – Os núcleos interpenetram-se, desorganizando-se.
3 – Uma parte da sua energia dá origem ao aparecimento de partículas, libertando muito calor.
4 – Quarks e gluões são libertados formando um plasma quark-gluão.
5 e 6 – À medida que o meio arrefece, os quarks dissociam-se dando origem a milhares de partículas.

No final desta era, houve um novo “congelamento”, uma nova mudança de fase que fez com que a força electrofraca se dividisse na força fraca e na elctromagnética. As quatro forças estão finalmente autónomas. Com esta autonomização, os quarks e os leptões adquiriram a sua individualidade.


Era Hadrónica: 10-6 < t < 1 s
A matéria consistia em alguns protões e neutrões nadando num mar de leptões. Cessou a aniquilação e materialização dos mesões. Deu-se um desacoplamento dos neutrinos que, ao deixarem de estar associados aos electões, seguiram finalmente o seu caminho em liberdade. Esta “Radiação de Neutrinos de Fundo” , embora diferente, segue um esquema análogo ao da Radiação Cosmológica de Fundo. Esta radiação ainda não foi detectada não só porque o seu espectro é pouco intenso, mas também porque os neutrinos praticamente não interagem com a matéria.


Era Leptónica: 1 < t < 10 s
A esmagadora maioria dos hadrões e anti-hadrões aniquilou-se mutuamente deixando o Universo cheio de leptões, particularmente os mais leves, que podiam ser criados pela energia ambiente. Contudo, o seu reinado foi curto pois aos 10 s, também os leptões e antileptões se aniquilaram e já não havia energia suficiente para os criar.
Um pequeno excesso de electrões salvou-se daquele massacre, passeando-se por entre os neutrões e protões e um mar de radaição.


Era da Radiação (ou dos Fotões):  10 s  < t < 380 000 anos
Com a maior parte das partículas aniquiladas, o Universo tornou-se um mar de radiação, onde os fotões predominavam largamente.
Acontece um fenómeno curioso: é que os fotões, apesar da sua esmagadora maioria, não conseguiam libertar-se da suas interacções com os electrões. Chocavam continuamente com eles, deslocando-se de um modo aleatório ao sabor das colisões. Assim sendo, apesar da radiação inundar tudo, não era possível seguir os raios de luzes por estes se embrulharem no meio dessa radiação. Daí que o Universo se apresentasse totalmente opaco, pois os fotões não tinham trajectórias lineares. Imagine-se em dia de forte nevoeiro, as luzes dos automóveis não conseguem iluminar mais de meia dúzia de metros: é que os fotões de luz são “aprisionadas” pelas gotículas do nevoeiro e obrigados a seguir trajectórias erráticas. Assim aconteceu nesses tempos afastados do Universo. 
Também nesta era podemos destacar alguns fenómenos
  
a) Nucleossíntese Cosmológica: 3 < t < 15 minutos
A partir dos 3 minutos, os protões e neutrõe começaram a associar-se, mas a energia ainda era muito elevada, cortando as ligações mútuas, deixando-os de novo isolados. Essencialmente o Universo é um enorme reactor de fusão (nuclear) contínua. Contudo, a temperatura baixou de tal modo que já não havia energia suficiente para romper as ligações protão-neutrão. Assim surgiram os primeiros núcleos atómicos, por adição de protões e neutrões num mecanismo chamado nucleossíntese cosmológica. A matéria começava a dar os primeiros passos para se tornar dona da situação.
Quando esta era termina, está definida a composição química do Universo.
  
b) Era da Recombinação: 10 000 < t < 380 000 anos
Durante este tempo, os protões e os neutrões formam os núcleos atómicos. E, pouco a pouco, os electrões vão-se associando a eles para formar átomos, ficando alguns livres de tal modo que nem os átomos acabam por se formar nem os fotões aprisionam definitivamente os electrões.  Inicialmente tratou-se de um bailado dos electrões ora interagindo com os fotões ora associando-se aos núcleos.

Apesar de se situar a Recombinação à volta dos 380 000 anos, este gráfico mostra a sua complexidade: Logo aos 18 mil anos, o Hélio captura um dos seus dois electrões. Por volta dos 100 mil anos acontece a captura pelo Hélio do seu segundo electrão. E só  entre os 250 e 380 mil anos é que o Hidrogénio captura o  seu único electrão..Este escalonamento no tempo ocorre porque a energia que prende os electrões aos núcleos é variável e portanto não acontecem todos ao mesmo tempo. 

No final, o arrefecimento, diminuindo a energia dos fotões, vê surgir os átomos, pois os electrões livres associam-se definitivamente aos núcleos. É neste momento, com a temperatura a 3000 K, que tem origem a radiação cosmológica de fundo. Com a libertação dos fotões, o Universo deixa de ser opaco e torna-se transparente. Os fotões passam a a deslocar-se em linha recta, sendo assim possível seguir a sua trajectória.


Era da Matéria: t > 380 000 anos
a) Era das Trevas: 380 000 anos < t < 800 Manos
Apesar de transparente, o Universo torna-se escuro, mergulhando numa era das trevas porque não há corpos brilhantes, pois as galáxias ainda não se formaram; os átomos andam perdidos no espaço escuro e frio.
É nesta era que se formaram os primeiros buracos negros que vão jogar um papel importante no aparecimento das galáxias. A geração de energia por eles causada vai dissociar os electrões dos átomos. É o tempo da reionização. A matéria neutra volta a estar ionizada.

Evolução Universo destacando a era das Trevas e a da Reionização


E, embora não se saiba ainda bem como, também a matéria escura deve ter tido uma importância crucial.
Uma questão importante é saber quais foram as primeiras estruturas que se formaram depois da era dos átomos: as estrelas ou as galáxias.

b) Formação das Estruturas: t > 800 Manos
Pouco a pouco o Universo vai-se enchendo de galáxias e estrelas e o “céu” torna-se brilhante e luminoso. A evolução continua com o aparecimento das estrelas de várias gerações e de galáxias que evoluem como berçários de estrelas.

Uma das galáxias mais antigas: teria o Universo pouco mais de 800 Manos (z = 6,34). O mais espectacular é ser um dos maiores berçários ou maternidades do Universo.

c) Aceleração da Expansão: t = 9 Ganos
Recentemente observou-se um fenómeno inesperado. Por volta dos 9 Ganos, a expansão do Universo começou a acelerar. As causas não são conhecidas. Mas fala-se de uma misteriosa energia escura de gravidade negativa (repele em vez de atrair) que actua por um processo que terá a ver com a “antiga” enorme explosão de energia que foi a Inflação, ocorrida nos primeiros momentos do Universo.



sábado, 13 de abril de 2013

RCF (RADIAÇÃO COSMOLÓGICA DE FUNDO)


Verificámos, no último post, que a existência da RCF seria um golpe fatal para a teoria do Estado Estacionário que nem a previa nem a sabia explicar e, por outro lado, um argumento (quase) decisivo para a teoria do Big Bang que a previa e a sabia explicar.
Simplesmente na altura em que foi prevista por Gamow (1948) não havia instrumentos astronómicos capazes de a detectar, caso ela existisse. Por isso vão passar quase duas décadas até que se pudesse avançar mais na explicação do Universo. E tudo surgiu donde menos se esperava. A sua descoberta, em 1964, deve-se a dois radioastrónomos, Penzias e Wilson.
Penzias nasceu em Munique, filho de pai polaco e mãe judia. E viveu um daqueles episódios históricos tipo “pescadinha de rabo na boca”. As autoridades alemãs tinham ameaçado de prisão os polacos que se recusassem a abandonar a Alemanha. Por outro lado, as autoridades polacas tinham retirado o passaporte a todos os judeus. Assim a família de Arno Penzias estava impossibilitada de atravessar fronteiras. Mas caso não o fizesse seriam todos presos. Foi então que, perante esta realidade, se iniciou nos Estados Unidos uma campanha para que cidadãos que declarassem ser familiares de judeus pudessem emigrar para este país. Quase a expirar o prazo apareceu um americano que se ofereceu para subscrever os seus pedidos de vistos de saída. Penzias, depois de se doutorar, foi trabalhar para os Laboratórios Bell, onde era o único radioastrónomo até se lhe ter juntado R. Wilson. Ao fim de algum tempo, conseguiram autorização para utilizar o radiotelescópio da empresa que se destinava a acompanhar os satélites de telecomunicações.


Antes, porém, resolveram estudar bem o aparelho para dele poderem tirar o máximo de proveito. Em particular queriam certificar-se de que o “ruído” (aqueles estalidos que ouvimos num aparelho de rádio) fosse mínimo. Para verificar o nível de ruído, resolveram apontar o radiotelescópio para uma zona do céu vazia de rádiogaláxias (galáxias que emitem não na luz visível mas na banda rádio), esperando não obter ruído. Para grande surpresa sua, o ruído lá estava bem nítido. Possivelmente outros teriam desistido, pondo de lado este pormenor, mas não os nossos investigadores. Procuraram aumentar a sensibilidade do telescópio e partiram à procura da fonte de um tal ruído de fundo. Começaram por procurar detectar uma possível fonte externa do ruído. Mas não havia grandes cidades próximas e, mesmo apontando para a cidade de Nova Iorque, não se verificou nenhuma alteração da sua intensidade. Pesquisaram, depois, a sua variação com o tempo, mas o ruído mantinha-se constante. Foram, então, pesquisar a possibilidade de o ruído provir do próprio aparelho. Verificaram um a um todos os componentes, ligações mal feitas, componentes electrónicos defeituosos, etc., mas nada. A dada altura, repararam num casal de pombos que viera fazer o seu ninho na antena. Seriam as cagadelas dos pombos? Apanharam os pombos, meteram-lhes uma anilha e mandaram-nos libertar a 50 km de distância. Entretanto, esfregaram a antena até ela ficar reluzente e dispunham-se a fazer o teste, quando de repente os pombos, acabados de chegar, resolveram fazer da antena a sua casa de banho. E depois disto tudo afinal não eram os excrementos dos pombos. Estavam de mãos a abanar, depois de um ano de trabalho. O ruído tinha diminuído mas não significativamente: havia qualquer coisa a emitir constantemente ondas de rádio em todas as direcções. Aliás o “céu” ainda hoje continua cheio de mistérios, como estes "ecos de luz":

O que causou esta explosão da estrela V838 Mon? Por razões desconhecidas, a sua superfície exterior expandiu, de repente, em Janeiro.2002, tornando-se a estrela mais brilhante da nossa galáxia. Então, de repente, desapareceu. Um flash estelar como este nunca tinha sido visto antes - supernovas e novas expelem matéria para o espaço. Embora o flash da V838 Mon pareça ser devida à expulsão do material para o espaço, na verdade trata-se de um eco luminoso. Um eco de luz é uma espécie de amplificador da luz: a luz do flash é reflectida por sucessivos anéis cada vez mais distantes no complexo conjunto de poeira interestelar que cercava a estrela.
V838 Mon fica a cerca de 20 000 anos-luz de distância na direcção da constelação do Unicórnio (Monoceros), enquanto o eco de luz acima atinge cerca de seis anos-luz de diâmetro.


Ou esta estrutura tão estranha existente no planeta Saturno:

Por que formam as nuvens um hexágono no pólo Norte de Saturno? Não se sabe ao certo. Descoberto pela Voyager, em 1980, nunca se viu nada de parecido no Sistema Solar. Se o Pólo Sul de Saturno já era estranho com o seu vórtice giratório, mais estranho ainda pode ser considerado o seu Pólo Norte. O padrão de nuvens bizarro foi mostrado com grande detalhe numa imagem obtida pela sonda Cassini. Imagens desta e de outras sondas mostram a estabilidade do hexágono, pelo menos, nestes últimos 20 anos: a nuvem mantém a sua estrutura hexagonal durante a rotação. Ao contrário de nuvens individuais que aparecem como um hexágono na Terra, o padrão de nuvens de Saturno parece ter seis lados bem definidos de comprimento quase igual. Neste hexágono cabem quatro Terras.
Fotografado de lado, a sombra escura do planeta Júpiter eclipsa parte do seu grande sistema de anéis, parcialmente visível no canto superior direito.

É verdade que a RCF já tinha sido prevista nos finais da década de 40. Mas também é verdade que essa “insignificância” (tantas descobertas todos os dias!!!) fora de todo esquecida até meados dos anos 60. Até que…
Em finais de 1964, Penzias foi a um congresso em Montreal, durante o qual falou do “seu” ruído a B. Burke, que alguns meses mais tarde lhe telefonou, pois acabara de receber a versão preliminar de um artigo dos astrónomos R. Dicke e J. Peebles. Nele se dizia que tendo estudado o modelo do Big Bang, se aperceberam de que devia existir por toda a parte uma radiação na banda dos microondas (com comprimento de onda da ordem do mm).
Os astrónomos ignoravam que Gamow fizera a mesma previsão 15 anos antes. E também não sabiam que Penzias e Wilson tinham acabado de a descobrir. Foi então que Penzias relacionou tudo isto e finalmente compreendeu a origem do ruído. Nada de pombos, nada de equipamentos; a sua origem tinha a ver com a origem do Universo. Por agora basta-nos perceber que o modelo do Big Bang tinha um argumento de muito peso a seu favor. Só nos resta prestar homenagem a estes dois radioastrónomos que levaram a sério até ao ínfimo pormenor a sua investigação. Há indícios de que o francês E. La Roux, em 1955, e o ucraniano T. Shmaonov, em 1957, terão detectado este ruído de fundo, mas não avançaram mais convencidos de que se tratava de alguma imperfeição do aparelho, mas uma imperfeição tolerável. Tiveram o Nobel ao seu alcance, mas faltou-lhe qualquer coisa. Por esta descoberta, Penzias e Wilson viriam a receber o Prémio Nobel em 1978.

Radiação do Corpo Negro
Como já tinha previsto G. Gamow, o Universo, porque era inicialmente uma sopa muito quente em equilíbrio térmico, devia agora estar a emitir uma radiação que os físicos chamam “radiação do corpo negro”. Cada corpo que tenha sido uniformemente aquecido – equilíbrio térmico – emite sempre uma radiação, cujo espectro tem uma característica única: a curva da sua radiação apresenta um pico que depende apenas da temperatura do corpo que a emite. Dois objectos quaisquer à temperatura de 2000 K apresentam o mesmo pico para a intensidade máxima da sua radiação. A única variável que faz deslocar o pico da emissão máxima é a Temperatura como se observa no gráfico seguinte.

Radiação de um "corpo negro" a várias temperaturas
O gráfico mostra como o λ máx aumenta conforme a temperatura do corpo vai diminuindo

Conforme vai arrefecendo, o corpo negro vai emitindo em comprimentos de onda maiores. Assim, o sol, cuja cor predominante é o amarelo, tem um pico de intensidade máxima por volta dos 550 nm (nanómetros).
Observando esta curva podemos tirar duas conclusões:
                - seja qual for o corpo, estrela ou ferro em brasa ou o corpo humano, emite um tipo característico de radiações: a maior parte das vezes, a emissão é no invisível, pois a luz visível ocupa uma pequena parte do espectro electromagnético emitido;
          - o comprimento de onda correspondente ao tipo da curva é tanto menor quanto maior é a temperatura a que o corpo se encontra, de acordo com a lei de Wien: λ máx = 0, 0028976 m /T ; como se vê, a cada λ máx corresponde apenas uma temperatura (T) seja qual for a natureza do corpo emissor.
Assim o Sol, cuja temperatura é da ordem dos 5 500 K deve emitir na banda dos 550 nm, ou seja na banda amarela; o corpo humano, que está à temperatura (T) de 310 K, emite na banda dos 100 nm, portanto para lá do extremo vermelho do espectro e, portanto, na zona invisível (zona infravermelha) aos nossos olhos.

Curvas de emissão de dois corpos a temperaturas diferentes
Aqui temos duas situações:
- a de um corpo com uma temperatura de 10 000 K, que emite a maior parte das radições no UV e poucas no Visível;
- um outro corpo com  a temperatura de 5 000 K, que emite no Visível.
   

Uma bomba para a Física Clássica
Nos finais do século XIX, os estudantes de Física eram aconselhados a seguir outro curso, já que a nível teórico, na Física, tudo estava descoberto; restava fazer as aplicações práticas destes princípios teóricos. A nossa auto-suficiência é encantadora!
Passada meia dúzia de anos, a Física Clássica foi abalada por três terramotos aparentemente simples. O primeiro deles foi precisamente a radiação do corpo negro. De acordo com a equação clássica, a intensidade da emissão devia aumentar quase infinitamente, quando o pico de emissão máxima se aproximava de comprimentos de onda muito pequenos. Ora isto contradiz claramente a curva experimental.
Catástrofe do Ultravioleta
Aqui temos dois gráficos sobrepostos: a curva a preto, do lado direito, mostra o modo como a Física clássica (não) resolvia o caso da "radiação do corpo negro". A curva rapidamente "explode" para o infinito na zona do Ultravioleta; daí o seu nome "catástrofe do Ultavioleta" . Só as novas equações deduzidas por Planck é que dão conta da realidade.

Esta discrepância foi chamada a “Catástrofe do Ultravioleta” e não havia maneira de encontrar uma solução. Planck resolveu o problema introduzindo uma hipótese: a luz emitida ou recebida só podia ter determinados valores e não ser um contínuo. A estes pacotes de emissão chamou quanta (plural de quantum). Isto é, a emissão da luz não podia tomar qualquer valor (contínuo), mas apenas alguns (discretos).
Sem o saber, Planck lançava a primeira pedra do grande edifício da Física Quântica. Planck pensava que a sua ideia era apenas um artifício matemático sem qualquer significado físico especial. Anos mais tarde, Einsten para explicar um outro terramoto – o efeito fotoeléctrico – utilizou o mesmo esquema, mas foi mais longe ao afirmar que afinal toda a luz era quantizada. A luz, de qualquer comprimento de onda, viaja sempre sob a forma de pequenos pacotes de energia que têm a ver com seu comprimento de onda.

Que informações dá a RCF?
Penzias e Wilson, como vimos, tinham descoberto a RCF. E tiraram duas informações: a radiação era uniforme; a temperatura correspondente era 2,7 K. Portanto, a previsão de Gamow (5 K) fora notável para os seus dados e atendendo a que os valores eram muitos baixos. Assim, não era apenas a existência da radiação, mas também a sua temperatura, que vinham reforçar o modelo do Big Bang.
                              
Além do problema da criação da matéria – ao qual nenhuma dos modelos dava resposta – havia uma outra dificuldade. Se o Universo era uniforme, como poderiam ter surgido as galáxias? Ora para o Big Bang, o Universo jovem era uma sopa quente em expansão: uma sopa uniformemente distribuída. O desafio era claro e necessitava de resposta. Os defensores do Big Bang tinham esperança de que existissem pequenas rugosidades naquela radiação. Se elas existissem, por mais pequenas que fossem, então tudo se poderia explicar. Cada uma das zonas mais densas seriam actuadas pela gravidade formando as estruturas que se seguiram. Então o modelo do Big Bang contaria a história de um Universo que teria começado como uma sopa altamente homogeneizada com pequeníssimas varações de densidade que teriam dado início à formação das galáxias.
Faltava o mais importante: provar a existência dessas rugosidades. E para isso nada melhor que a RCF. Porquê? Porque a RCF é uma radiação “fóssil” que “retrata” o Universo tal como era com a idade de 380 mil anos. Nesta altura deu-se uma revolução no Universo. Até então a “sopa” era formada por núcleos e electrões cada um para seu lado incapazes de se unirem devido à elevada temperatura do Universo. Ao atingir os 380 mil anos, a temperatura baixou o suficiente para que os electrões se ligassem aos núcleos, dando origem aos primeiros átomos. Assim aprisionados nos átomos, os electrões não podiam interagir com os fotões de luz, deixando-os livres. Dito de outra maneira, antes desta data, os fotões, porque estavam em interacção com os electrões, não seguiam uma trajectória linear, mas estavam em contínuas mudanças de direcção.

Libertação dos fotões
Fonte: S. SING, Big Bang, p. 174
Caso a): Os fotões interagem com os electrões que, devido às elevadas temperaturas, andam "à solta" não conseguindo ligar-se aos núcleos atómicos. Assim sendo, os fotões não podem seguir a sua viagem linear e ficam retidos, a mudar de trajectória cada vez que chocam com um electrão.
Caso b): Quando o Universo tinha 380 mil anos de idade, a temperatura baixou o suficiente para que os electrões se liguem aos núcleos e formem os primeiros átomos. Assim sendo, os fotões podem seguir a sua viagem linear e podem ser detectados mas tarde, por exemplo, hoje.Como estão num Universo em expansão, portanto, a arrefecer, os fotões vão "perdendo" energia e emitem espectros em que o λ máx está cada vez mais desviado para a direita. Hoje esse valor é da ordem de 1 a 2 mm, como se vê no gráfico seguinte.

Portanto, não era possível seguir os fotões nesses choques. Se olhássemos para trás, depararíamos com uma “parede”, pois a partir desse momento o Universo fica opaco à luz. Só quando ficaram livres, os fotões “congelaram” a forma que o Universo tinha nesse momento, com as suas pequenas variações de temperatura, e seguiram trajectórias lineares. Esses fotões, muito enfraquecidos (a expansão do Universo vai enfraquecendo a energia de tudo), constituem essa radiação de fundo, que agora foi descoberta por Penzias e Wilson. É correspondente à energia de radiação de um corpo negro à temperatura de 2,7 K. Portanto, esta é a temperatura média actual do Universo.

RCF Previsão a 3 K
Fonte: Les Dossiers de la Recherche, nº 35, p. 22.
As pequenas bolinhas negras dão os valores medidos experimentalmente. A curva a cheio, o espectro da RCF deduzido da teoria. Como se vê há uma coincidência plena.


A dificuldade em detectá-la resulta da sua pequena intensidade; daí as dificuldades de Penzias e Wilson para a medir. Verificaram que ela era uniforme fosse qual fosse a direcção em que apontassem o radiotelescópio.
Foram duas as conclusões de Penzas e Wilson:
                - a radiação existia e era uniforme;
                - correspondia a um corpo que radiasse à temperatura de 2,7 K.
Portanto, nada de rugosidades. Mas tinham de existir, pois sem elas não podíamos ter o Universo como hoje o temos, cheio de galáxias. Talvez elas fossem tão pequenas que os instrumentos disponíveis não tinham capacidade para as detectar. Esta era a convicção generalizada. Então, havia apenas que aperfeiçoar os aparelhos de medição.

COBE
Na década de 1970, o equipamento já era capaz de distinguir diferenças de 1 parte em 100, mas não era suficiente. Além disso, havia um outro problema é que a RCF situava-se na mesma banda de radiações (microondas) que a humidade atmosférica.
Por isso, uma primeira ideia foi colocar o detector da RCF num balão que subiria algumas dezenas de quilómetros e assim evitar a atmosfera na sua parte inferior, a mais densa. Mas também aqui surgiram dificuldades. A temperatura era tão baixa que rebentava com a cola usada no balão. Para lá disso, o balão ao regressar podia estatelar-se e perder todo o equipamento. G. Smoot teve a ideia de colocar o detector num avião. A escolha recaíu no famoso U-2. Apesar da sensibilidade ter aumentado para 1 parte por milhar, ainda não se detectara nada. Além do mais, o ar atmosférico que também radiava na banda das microondas da RCF obrigava a optar por uma medição feita fora da atmosfera terrestre, os seja, num satélite.
Em 1974, a NASA pediu sugestões para uma série de satélites Explorer. Curiosamente apareceram três propostas no mesmo sentido: colocar um detector da RCF num satélite. A NASA fundiu-as numa só. A preparação foi demorada e só em 1982 é que foi aprovado o projecto COBE (Cosmc Background Explorer: Explorador do Fundo Cósmico). Quando tudo estava pronto, aconteceu a explosão do Vaivém Challenger, em 28 de Janeiro de 1986. Houve que procurar outros caminhos. Então procuraram um novo lançador e a escolha caiu sobre a Ariane. Simplesmente, a NASA não queria que uma agência concorrente fosse utilizada!!! Viraram-se então para a companhia McDonnell-Douglas que aceitou o desafio, mas surgiu mais um problema: o satélite COBE pesava cerca de cinco toneladas e o foguetão Douglas só podia transportar metade. Havia que emagrecer o COBE. Finalmente, a 18.Nov.1989, quinze anos depois da proposta ter sido entregue à NASA, foi lançado o satélite COBE

COBE
Este satélite levava três instrumentos para investigarem a radiação do Universo desde o infravermelho até às microondas: o FIRAS (Far Infrared Spectrometer), espectrómetro de infravermelhos, tinha como missão, medir o espectro da RCF; o DMR (Differential Microwave Radiometer), serviria para observar as pequenas irregularidades da RCF; e o DIRBE (Diffuse InfraRed Experiment) para detectar a radiação infravermelha produzida pelas estrelas e galáxias.

     
A chegada dos primeiros dados mostrou que tudo estava a funcionar bem. Faltava agora encontrar as rugosidades. Ao fim de dois anos de estudo das 70 milhões de medições feitas, lá apareceram as rugosidades: 1 parte por 100 000.
               
Quero lembrar apenas que houve um trabalho que geralmente não se refere mas é bom recordá-lo: a imagem obtida não é a que foi publicada, mas uma outra que continha também o ruído de fundo da nossa galáxia (barra horizontal clara) e do Sistema Solar (estrutura em S na imagem abaixo). Portanto, foi precisa “subtraí-la” para obter a imagem “pura” da RCF.

RCF medida pelo COBE, com os "ruídos" do Sistema Solar e da nossa Galáxia


A recolha dos vários dados fornecidos pelo COBE permitiu
- calcular a temperatura do Universo: -2.726 K.
- verificar que a radiação apresentava desomogeneidades da ordem do 0,001%.
Contudo, a sua sensibilidade angular era pequena. Havia que melhor este aspecto.


WMAP
Para obter imagens mais precisas foi lançado, em 2003, um novo satélite com a sonda WMAP – Wilkinson Microave Anisotropy Prove – com uma resolução angular muito maior. Assim se obteve uma imagem muito mais precisa.

Comprando com o COBE a principal diferença visível a "olho nu" é a sua muito maior resolução. Repare-se no tamanho das manchas do COBE e as do WMAP.

Foi ainda possível determinar a idade do Universo e a sua composição em termos de matéria e energia (ver abaixo).

Planck
Os instrumentos de medida foram-se aperfeiçoando e os dados acumulados pela WAMP estimularam a uma clarificação maior. Nesse sentido, foi lançada em 2010 a sonda Planck, cuja imagem da RCF foi recentemente publicada.

RCF medida pela sonda Planck (APOD 25.Mar.2013)

Os dados existentes neste momento podem resumir-se na seguinte tabela:


Como foi possível obter tanta informação a partir de um mapa aparentemente tão simples?
Através de um tratamento matemático do chamado “espectro de potência”, que é obtido a partir das medições da RFC.


Este método é semelhante, mas mais elaborado (decomposição em esféricas harmónicas), ao que se utiliza em acústica para analisar os sons através do pico principal (som principal), primeira harmónica, segunda harmónica, etc..
Medindo a variação das flutuações na temperatura da RCF através da decomposição em harmónicas, os observadores determinaram a diferença de temperatura entre duas regiões do céu, separadas por um certo ângulo, e concluíram que o Universo é plano (lembram-se que há três tipos teóricos de Universo: aberto, fechado e plano?) pois as flutuações são máximas em escalas de 1°.
A posição, altura e espaçamento relativo entre os picos são sensíveis aos parâmetros cosmológicos dos modelos que representam o Universo. O conhecimento da forma do espectro de potência da RCF permite estimar esses parâmetros e separar as diferentes classes de modelos cosmológicos. Por exemplo, a relação entre os dois primeiros picos dá informação sobre a matéria escura existente.